A poética
simplicidade de relatar as dores e prazeres do cotidiano com a graça
nordestina, feita do povo para o povo.
Por Natália Noro
![]() |
(Fotos: Natália Noro/ Edição de Imagem: Andressa Dantas) |
A tradição do barbante não se manteve no Brasil, mas também não impediu que o povo desse seu jeito próprio de perpetuar a cultura de forma única. Aqui, os cordéis são vendidos em mercados e feiras abordando temas do cotidiano e fatos históricos de forma engraçada com estrofes comumente com seis, oito ou dez versos. Simplificando, para o cordelista e poeta Abaeté, idealizador e organizador da Casa do Cordel, "o cordel é uma poesia rimada e metrificada, como uma música; você pega uma sanfona, um pandeiro e começa a cantar. É um gênero popular, você pode ter dez mestrados, mas você fala a linguagem do povo."
Outra característica predominante do cordel publicado em forma de folheto é a xilogravura. Foi inventada na China e significa gravura em madeira. O artesão entalha o desenho na madeira e utiliza tinta para pintar a parte em relevo e prensa, como se fosse um carimbo, na superfície que deseja ilustrar.
Com um menor refreio da mídia, as pessoas começaram a perder a vergonha da sua própria cultura. O que antes estava fincado apenas nas raízes nordestinas, hoje ganha todo o país, estando presente em estados do sul e sudeste. Foi criada, inclusive, no Rio de Janeiro, a Academia Brasileira de Literatura de Cordel em 1988 com o intuito de reunir todos os expoentes desse gênero tipicamente nacional.
Hoje, o Rio Grande do Norte é o estado que mais se produz cordéis. A Casa do Cordel, localizada na Cidade Alta, foi criada devido a percepção da carência de um espaço voltado totalmente para essa cultura. O objetivo, diz Abaeté, é colocar o cordel no lugar que ele merece, que é a educação, sendo uma forma de ensinar as pessoas brincando. Ele também conta que "as professoras nos diziam que os alunos tinham muita dificuldade com a redação, até que ela começou a pedir que fizessem-a em cordel e eles foram desenvolvendo e hoje são nota dez em redação. Principalmente as crianças entre dez a doze anos, elas adoram."
Patativa do Assaré não era dez em redação, porém sua alfabetização iniciática não o impediu de cumprir sua missão como poeta da justiça social. Suas poesias, além de repentes, viraram folhetos nos quais ele sempre abordou de forma simples a aridez do universo da caatinga. Seus poemas mais famosos são "Triste Partida", que virou música na voz de Luiz Gonzaga, "Inspiração Nordestina" e "Cantos de Patativa".
Por fim, o cordelista Abaeté conclui dizendo que "uma vez eu tava no interior e um cara me perguntou o que devia fazer para ser um bom poeta, aí eu disse 'um bom poeta não precisa ser rico ou pobre ou escravo do dicionário, catando palavras bonitas. Um bom poeta acredita na sua intuição, popular ou erudita, tudo o que faz é bonito quando vem do coração.'" E é exatamente aí que se encontra a magia do povo e do cordel que se enlaçam na poesia de serem uma coisa só.
1 comentários:
Perfect! Esssa matéria tem que ser públicada na Folha de São Paulo :)
Postar um comentário